CORDEL PARAÍBA

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Bem-vindos, peguem carona/Na cadência do cordel,/Cujo dono conhecemos:/Não pertence a coronel./É propriedade do povo:/rico, pobre, velho, novo/deliciam-se deste mel./Rico, pobre, velho, novo/Deliciam-se neste mel.

(Manoel Belisario)



domingo, 3 de abril de 2011

O cordelista que ‘arrombou a festa’ pobre de Caê e Bial

A Voz do Cordel

Extraído do site “Matéria Incógnita” - www.materiaincognita.com.br

UM TERREMOTO CHAMADO ANTONIO BARRETO

Por Paulo Maurício Machado *

           Um cordelista, poeta e cantador lá das caatingas, como convém, surfa uma onda veloz para se transformar num dos nomes mais badalados da Internet na atualidade. Ele surge como uma espécie de poseidon pós-moderno a precipitar o terremoto que pegou todos de surpresa, inclusive o próprio artista.

           Antonio Barreto, natural da pequenina Santa Bárbara, no sertão da Bahia, sequer imaginava que ao enfrentar duas celebridades apenas com a energia liberada por estrofes e rimas pudesse causar tamanho estrago. O impulso foi dado por um tsunami colateral de emails que inundou as caixas postais eletrônicas até verter para centenas – quem sabe milhares – de blogs, portais, fórums e redes sociais.

Foi um verdadeiro alagão!

ÍDOLOS DE BARRO

          A magnitude do primeiro abalo já pôde ser sentida nos versos jocosos sobre Caetano Veloso: um sujeito alfabetizado, grosseiro e deselegante, inspirados nas recentes críticas do também baiano ao Presidente da República, a quem referiu-se como “analfabeto, grosseiro e cafona”.

           A onda de choque que veio a seguir tampouco poupou o biógrafo oficial de Roberto Marinho, o falecido chefão das Organizações Globo. O dublê de apresentador Pedro Bial viu a sua imagem literariamente desconstruída pelo humor sarcástico rimado nas 25 septilhas de Big Brother Brasil, um programa imbecil.

           “Foi devastador, a casa caiu”, testemunha a blogueira Nívia de Oliveira Castro, a primeira a registrar o impacto do sismo eletrônico involuntariamente desencadeado em fulminante escala pelo cordelista.

FAZENDO A FAXINA

          Quer se concorde ou não com a magnitude das críticas, a força transformadora do também educador Antonio Barreto é acima de tudo higienizadora. E esta talvez seja a sua grande contribuição à coletividade: trazer o Cordel à superfície com a cumplicidade solidária dos internautas para questionar determinados modelos de deseducação espetacularizada.

          Afinal, nunca antes na história da Internet nesse País, pelo menos que me recorde, este gênero literário alcançou tanta visibilidade fora do âmbito dos iniciados e das regiões geográficas onde compõe um precioso mosaico cultural.

          O fato é que a literatura de cordel chegou logo arrombando a festa na poderosa rede virtual do Sul-Sudeste.

ARMA CONTRA O PRECONCEITO

          Pela observação das opiniões deixadas nas caixas de comentários de blogs e redes sociais, é evidente a presença de enorme quantidade de jovens que mantêm seu primeiro contato com uma forma tão peculiar e envolvente de se fazer poesia.

          Providencialmente, Raul Poeta alerta àqueles que ainda não atinaram para o significado dessa arte secular:

          “Algumas pessoas – poucas, por felicidade – confundem as coisas e não conseguem captar o espírito da tradicional cordelança nordestina. Não há nada de pessoal nessas críticas rimadas! Os cordelistas escrevem de maneira jocosa, mas por vezes retratam realidades desesperadoras. Uma outra característica é o uso de recursos textuais como o exagero, os mitos, as lendas, e atualmente o uso de ironia ou sarcasmo para fazer críticas sociais ou políticas”.

          E mergulha então no epicentro da questão:

          “Usar uma imagem estereotipada como personagem também é muito comum, às vezes criticando a exclusão social e o preconceito, às vezes fazendo uso dos mesmos através do humor sarcástico”.

CONTRADIÇÕES PARA CONSCIENTIZAR

           Didático, o próprio Antonio Barreto ensina que “o cordel é um instrumento eficaz de conscientização e, às vezes, o cordelista precisa utilizar certos recursos aparentemente bobos, contraditórios, alterar a sintaxe e etc, mas com a finalidade de alcançar o seu objetivo”.

            Esse psicopedagogo, poeta e cantador que modestamente se define como “um sertanejo pacato e sem vaidades” tem buscado ainda mais serenidade para lidar com a repercussão do seu cordel. E conclui: “Isso pode ser passageiro, mas também pode tomar outra dimensão; aconteça o que acontecer, seguirei tranquilo e reflexivo”.

Esse é o problema!

          Quando reflexões tão incandescentes saltarem da ponta da pena para a tela dos computadores novamente, o mais provável é que os sismógrafos virtuais emitam sinais de alerta para a possibilidade de ocorrência de novos tremores seguidos de tsunamis e chuvas torrenciais de emails.

          E aí, outros poderosos que estiverem na reta vão desmoronar

* Paulo Maurício Machado é empresário, jornalista, publicitário e estudioso do desenvolvimento da Web e comportamento na blogosfera. Nas (poucas) horas vagas edita o blog Chefe de Redação, na Matéria Incógnita.

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